Astronauta brasileiro será candidato a deputado. Veja a entrevista.

Pontes filiou-se ao PSB

Opinião: Antes de lerem, lembrem-se do que Platão nos ensinou: "Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política. Simplesmente serão governados por aqueles que gostam." Torço por você Marcos Pontes!

O astronauta Marcos Pontes, primeiro brasileiro a ir ao espaço, anunciou que será candidato a deputado federal por São Paulo nas próximas eleições. Piloto de combate e engenheiro de sistemas, ele foi escolhido em 1998 para ser o primeiro astronauta nacional, como consequência de um acordo entre a Agência Espacial Brasileira e a Nasa para participação tupiniquim na Estação Espacial Internacional. A parceria entre americanos e brasileiros acabou azedando, vítima de impasses dentro do nosso governo, mas Pontes acabou voando ao complexo orbital em 2006, numa espaçonave russa Soyuz.
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Em órbita, ele realizou os experimentos selecionados pela AEB como parte da Missão Centenário, que comemorou os cem anos do primeiro voo de um avião feito pelo brasileiro Alberto Santos-Dumont. A iniciativa consumiu cerca de US$ 10 milhões. Já que a moda agora é comparar tudo com o custo da Copa de 2014, só o que foi gasto com os estádios (cerca de R$ 9 bilhões) daria para realizar uns 400 voos espaciais como aquele.

A viagem do astronauta ganhou contornos de polêmica quando, logo após seu retorno, Pontes passou à reserva da Força Aérea Brasileira. Algumas reportagens veiculadas à época davam conta de que ele estava se aposentando precocemente para poder se dedicar ao mercado de palestras. Pontes nega que isso tenha acontecido. Ele alega que sua passagem à reserva era obrigatória pelo regulamento da FAB e que a história das palestras não é bem a que se conta.

“Quando fui transferido para a reserva militar pelo Comando, meu salário caiu a um terço do que era. Aí surgiu a lenda na imprensa de que eu tinha saído para dar palestras. Embora não tenha sido essa a intenção de quem escreveu essa bobagem, aquilo para mim foi ótimo, pois as empresas e instituições de bom senso e ávidas por conhecimento para seus recursos humanos passaram a me procurar”, disse Pontes. “Foi assim que resolvi o meu problema financeiro na época.”

NA ROTA DA POLÍTICA
Para se candidatar a deputado federal em 2014, Pontes filiou-se no ano passado ao PSB — partido que comandava o Ministério da Ciência e Tecnologia à época de seu voo espacial. Na ocasião, Eduardo Campos, hoje presidenciável na oposição ao governo Dilma, era o ministro.

Com a decisão, o astronauta brasileiro segue caminho similar ao de outros pioneiros do espaço, como John Glenn, primeiro americano a orbitar a Terra, e Harrison Schmitt, primeiro geólogo a visitar a Lua. Ambos tornaram-se senadores nos anos 1970, e Glenn permaneceu na política até 1999.

Não foi uma escolha simples, segundo Pontes. Em 2006, logo após voltar do espaço, ele foi pressionado para entrar na política, mas preferiu não fazê-lo. Agora, ele alega ter sido motivado pelas manifestações que tomaram conta do país desde junho do ano passado. “Eu não quero me sentir, lá no futuro, covarde por não ter me apresentado para ajudar meu país nesse momento de crise”, afirma o astronauta. Confira abaixo a íntegra da entrevista.

 Você diz em seu livro “Missão Cumprida” que foi para a reserva por opção da Força Aérea, e não sua. Eles podem fazer isso, colocar um oficial compulsoriamente na reserva?

Marcos Pontes - Sem dúvida, isso é prerrogativa do Comando. Além disso, todos temos que obedecer a lei. O fato de eu ser astronauta não muda e nem deve alterar esse fato (assim como políticos, autoridades, e todas as pessoas deveriam obedecer a lei no Brasil). Isto é, no meu caso, segundo o artigo 12 do Regulamento de Promoções da Aeronáutica (REPROA – Decreto No 89.509 de 3 de abril de 1984), para um Tenente Coronel ser promovido ao posto de Coronel é condição obrigatória ter realizado com sucesso o Curso de Comando e Estado Maior da Aeronáutica (ECEMAR), que tem duração de um ano, presencial, no Rio de Janeiro, e dentro do tempo de promoção da sua turma (um oficial de uma turma da AFA não pode ser ultrapassado na promoção por um oficial da turma seguinte, “mais moderna”, no jargão). Como eu estava a serviço da AEB, na função civil de astronauta desde 1998, em tempo integral em Houston, não pude fazer a ECEMAR com a minha turma e, portanto, o Comandante da Aeronáutica cumpriu a lei e me transferiu para a reserva como Tenente Coronel.

– Muito se falou, logo após sua missão espacial, que você teve problemas com a FAB por cobrar para fazer palestras. O que você tem a dizer sobre isso?
Pontes - Muitas bobagens foram faladas por pessoas que não tinham a menor noção ou conhecimento do assunto. O fato é que sempre tive excelente relação com a Força Aérea, na qual tenho uma longa carreira militar ilibada, condecorada e de grande prestígio, que tem servido de modelo e inspiração para jovens de todo o Brasil. Muitos militares que hoje estão nas fileiras das Forças Armadas iniciaram suas carreiras motivados direta ou indiretamente por mim e pela minha carreira militar e de astronauta. Sobre as palestras, quando fui transferido para a reserva militar pelo Comando, meu salário caiu a um terço do que era. Aí surgiu a lenda na imprensa de que eu tinha saído para dar palestras. Embora não tenha sido essa a intenção de quem escreveu essa bobagem, aquilo para mim foi ótimo, pois as empresas e instituições de bom senso e ávidas por conhecimento para seus recursos humanos passaram a me procurar, solicitando que eu fizesse palestras sobre os temas que aprendi com o meu trabalho no Brasil e no exterior. Foi assim que resolvi o meu problema financeiro na época e, de quebra, ganhei uma nova “profissão” — palestrante — que adoro. Hoje em dia, além de ser astronauta à disposição do Brasil, faço centenas de palestras no Brasil e no exterior, ajudo milhares de pessoas e empresas com os meus conhecimentos e sou muito feliz com isso.

– Há quem diga que você é oportunista e que sobrepôs seus interesses aos do país no desenrolar dos planos para a Missão Centenário. Como você vê essa afirmação?
Pontes - Digo que quem fala isso precisa sair da ignorância e se informar com fatos, não versões criadas na época provavelmente por razões políticas. Oportunistas foram aqueles que quiseram se aproveitar da grande visibilidade da primeira missão espacial tripulada da história do Brasil para tentar “aparecer” na mídia criando ou falando tolices a meu respeito e a respeito da missão da Agência Espacial Brasileira. Se essa pessoa tiver coragem e competência para passar pelo que eu passei durante minha carreira e arriscar sua vida como piloto de combate e depois como astronauta a serviço pelo país, e continuar, como eu continuo, trabalhando pelo Brasil por mais de 37 anos, ela terá o mínimo de “moral” para afirmar algo sobre minha vida e dedicação à minha pátria.

– Você decidiu entrar na política num momento em que a classe política é vista com absoluta desconfiança pela maior parte da população. Não tem medo que isso contribua para reforçar aspectos negativos da sua imagem pública?
Pontes - Sou um profissional formado e qualificado que vive pelos seguintes valores desenvolvidos na Força Aérea Brasileira: coragem, lealdade, honra, dever e pátria. Já decolei em condições críticas, em que a maioria dos aviadores diriam ser impossível, para cumprir minha missão e defender meu país como piloto militar. Eu coloco minha vida à disposição para cumprir missões espaciais para o Brasil como astronauta. Pode ter certeza que a motivação por trás de tudo isso não é salário ou cargos; é algo muito mais forte e que anda em falta no Brasil: patriotismo. Eu fui treinado para defender o Brasil de inimigos externos e internos, e é isso que me leva a entrar para a política nesse momento crítico. Eu posso e vou ajudar, cumprindo mais uma missão pelo país, agora na política. O país é mais importante que minha imagem ou que minha vida. Aliás, se o país quiser resolver o “problema político”, precisa tomar consciência de que é importante a participação de todos para atrair para a política pessoas honestas e que, acima de tudo, amam nosso país. Nunca devemos fazer o contrário, isto é, desanimar ou afastar pessoas e profissionais bons da política. Infelizmente, essa atitude ilógica é o que vemos hoje no Brasil, e isso tem que mudar para mudarmos a imagem da política.

– Avaliando em retrospecto, como você vê a história da participação brasileira na ISS e a Missão Centenário em particular?
Pontes - O Brasil poderia ter feito muito mais para nossas empresas e instituições dentro do programa da ISS. Infelizmente, a gestão do programa não teve a visão necessária e, como em outros programas de C&T e educação, não houve o apoio político (ou conhecimento e preparação dos políticos) adequado. Para quem tem conhecimento realmente e sabe dos fatos e números, ficou claro que a Missão Centenário da AEB foi o projeto de melhor custo-benefício do programa espacial brasileiro. Mas ainda poderia ter sido muito melhor.

– Fosse você o presidente da AEB na ocasião do seu voo, teria perseguido o caminho escolhido, de praticamente abandonar a parceria com a Nasa e fazer a missão com os russos?
Pontes - O problema não foi essa escolha, feita pela administração da AEB na época do voo, mas a falta de compromisso com o esse programa internacional que as gestões anteriores tiveram. Se o Brasil tivesse cumprido sua parte desde o início do programa (começado em 1997), a primeira missão teria sido a bordo do ônibus espacial em 2001, levando uma parte construída no Brasil (o Express Pallet), e a indústria brasileira teria lucrado 120 milhões de dólares, se desenvolvido no setor e se qualificado como exportadora no multimilionário mercado espacial internacional. Como em outras ocasiões e programas, o Brasil “perdeu o bonde” em 2001 e quase foi expulso do programa por incompetência técnica-gerencial. Já do meu ponto de vista, como astronauta profissional da turma 17 da Nasa, ter feito o curso e treinado na Nasa e depois fazer treinamento e voar com os russos foi uma experiência mais rica em conhecimento e crescimento profissional. Porém, seria ainda mais interessante para o país se eu tivesse voado em 2001 com os EUA e depois com a Rússia. Se eu fosse presidente da AEB ou Ministro da C&T, eram esses resultados, para a AEB, para as empresas brasileiras, para a ciência brasileira, para a educação brasileira, para a politica brasileira e para o moral brasileiro que eu buscaria desde o início do programa.

– Na Copa do Mundo tem se falado muito em legado. Qual é o legado da Missão Centenário? Houve legado?

Pontes - Um legado enorme. Aqui não há espaço para descrever todos os detalhes, mas, por exemplo em ciência e tecnologia (e pouca gente sabe disso), em conhecimento de programas internacionais, em metodologia de projeto, em educação (veja, por exemplo, os números da OBA [Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica] antes e depois da missão, assim como o número de cursos de engenharia aeroespacial públicos criados — todos — depois da missão) e até na representação do Brasil na ONU para desenvolvimento industrial, onde temos hoje em dia um Embaixador graças à Missão Centenário.

– Sua ambição agora é se eleger deputado federal. Quais são seus planos de atuação no Legislativo?
Pontes - Na verdade, não vejo isso exatamente como uma “ambição”, mas como uma meta dentro de mais uma missão para o país. Sinceramente, eu preferia voltar ao espaço dentro de um ou dois anos (e tenho convite de empresas privadas para trabalho como astronauta profissional que permitiria isso). Contudo, eu tenho dois objetivos que me motivam a entrar para o Congresso Nacional: um pessoal e um patriótico. O pessoal é que eu não quero me sentir, lá no futuro, covarde por não ter me apresentado para ajudar meu país nesse momento de crise com os conhecimentos que adquiri ao longo da minha vida. Isto é, ser uma opção para a população brasileira, que sempre reclama da falta de alternativa de candidatos honestos e qualificados profissionalmente para o Congresso. O objetivo patriótico é ajudar a construir um país mais evoluído a partir de educação, ciência e tecnologia aplicadas, para melhorar a vida das pessoas no dia a dia em temas como sustentabilidade, saúde e segurança, para termos melhores condições e paz para quem trabalha nas cidades. Essas atividades, obviamente, envolvem as áreas de minha atuação profissional técnica (aviação, espaço, defesa, educação, ciência, relações internacionais, sustentabilidade etc.), mas tudo deve ser feito com transparência, honestidade, ética, patriotismo e promoção de valores que possam motivar outras “pessoas do bem” a entrarem para a política e ajudarem a transformar a imagem politica nacional. É por isso que assinei, no último dia 27, no PSB, a ficha de pré-candidatura a Deputado Federal por São Paulo.

– Caso seja eleito e então chamado a preencher um cargo no Executivo (presidente da AEB, ou ministro, por exemplo), aceitará a proposta, deixando um suplente na Câmara?
Pontes - Eu não gosto da ideia de ser eleito como representante de milhares de pessoas para um cargo e depois deixar esse cargo para outro sem cumprir a missão até o final. Assim, a princípio, eu gostaria de ir até o final do mandato no mesmo partido e no mesmo cargo. Contudo, se for de interesse dos que me elegeram (e a internet/TV ajudam muito nessa resposta hoje em dia) que eu assuma outra posição que eles considerem mais adequada para mim, certamente poderei considerar assumir tal cargo.

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